"A corrupção é vil porque prejudica toda a gente excepto os corruptos: o
corruptor e o corrompido. O benefício dos corruptos, em dinheiro ou favores, depende do prejuízo do povo.
É por isso que a corrupção corrompe. Se a certa altura as pessoas pensam
que para receber um benefício (uma operação, uma licença), é preciso pagar
luvas, então até as mais pobres e justas estragarão as vidas à procura desse
dinheiro, achando que não têm alternativa.
A corrupção facilmente se torna um sistema, acompanhada por
racionalizações: “Se toda a gente suborna, porque é que eu, com a minha
honestidade, me hei-de lixar? Que mal faz dar umas coroas àqueles gajos que até
ganham mal, coitados?”
Olha-se para os corruptos e diz-se, com espanto: “Eles devem pensar que
somos estúpidos!” É um erro. Eles não pensam que somos estúpidos. Eles
simplesmente não pensam em nós: é esse o mal. Estão-se nas tintas para nós e
para as consequências do que fazem.
Os corruptos é que dizem de nós: “Eles devem pensar que eu sou estúpido!”
Sim, porque, para eles, só um estúpido recusaria aquela oportunidade de
beneficiar pessoalmente à custa de toda a gente prejudicada por esses favores e
desvios, por essas injustiças e desigualdades.
São corruptos e é por isso que pensam assim. Não têm salvação. Mas nós sim: é apanhá-los." Miguel Esteves Cardoso